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    Em isolamento, brasileiro vai menos ao mercado e compra o básico, mostra estudo

    Valor por compra aumentou 39%, mas frequência caiu 10% e há até 44% menos clientes nas unidades

    Manuela Tecchio, , do CNN Business, em São Paulo

    Desde que o isolamento social foi implementado como medida de prevenção ao coronavírus em todo o país, o brasileiro tem ido menos ao supermercado, mas comprado mais a cada visita. Na somatória total, os gastos diminuíram. É o que mostra um levantamento de dados com 2.3 milhões de clientes das 16 redes de varejo alimentar do programa de fidelidade Dotz, adiantado ao CNN Business.

    Na quarentena, o valor que os clientes gastam numa única compra aumentou 39% – de R$ 95 para R$ 132. Por outro lado, o número de clientes nas lojas físicas despencou 44%. Dos que ainda visitam supermercados e atacados, a frequência de compras também caiu, em cerca de 10%.

    “Houve um boom de abastecimento no período pré-lockdown, mas, depois, quando a situação se normalizou, as pessoas passaram a ir menos vezes ao supermercado. Geralmente os clientes têm gastado mais por compra, mas o valor total gasto no varejo de alimentos acabou caindo”, explica o vice presidente da Dotz, Fábio Santoro.

    O que acontece muitas vezes, segundo Santoro, é que uma única pessoa tem feito a compra para toda a família ou mesmo para vizinhos e amigos, além de levar produtos para mais dias. O diretor comercial Julio Michelassi, da rede de supermercados Michelassi, que possui duas lojas no estado de São Paulo, percebeu exatamente esse movimento nos supermercados que administra.

    Durante o mês de abril, a queda esperada para as vendas não se concretizou, com um período de transações acima da média, acompanhando o mês de março. 

    Nas lojas houve uma diminuição na frequência das compras, mas que foi compensada por uma elevação de 60% no gasto, além de um aumento de 50% na quantidade de itens por cupom fiscal. Passada a Páscoa e com o comércio parado há cerca de 30 dias, ele espera para ver se a queda enfim vai atingir as lojas que administra. 

    Michelassi garante que não enfrenta mais problemas de abastecimento, como os que aconteceram no início do lockdown, com a falta de álcool e papel higiênico. Agora, de acordo com ele, o maior problema é o estoque de gás, para as unidades que trabalham com o produto.

    Melhor, mas não muito

    Dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) confirmam que o movimento tem mesmo sido acima da média. Em fevereiro, as vendas do setor supermercadista apresentaram crescimento de 4,6% na comparação com o mês anterior e alta de mais de 15% em relação ao mesmo mês do ano de 2019.

    No acumulado do ano, as vendas apresentaram crescimento de 10,35%, na comparação com o mesmo período do ano anterior. A associação, entretanto, atribui o aumento ao Carnaval e ao fato de que este fevereiro teve mais fins de semana que outros, e não ao isolamento social.

    “Está todo mundo achando que o mercado está bom pra os supermercados, mas essa imagem é falsa”, explica Michelassi, que diz que os picos de venda mais atrapalham do que ajudam, já que, nesse sistema, é difícil vender com variedade, porque o cliente vem buscar apenas o que é de necessidade básica. 

    De acordo com ele, as unidades que administra vão passar por um ajuste do catálogo e uma série de produtos e marcas deve sair das prateleiras em breve. “Estamos ainda tentando entender esse novo comportamento do consumidor. Pelo jeito, está trocando de marca, está tentando economizar. Comida pronta e artigos da rotisseria e da lanchonete caíram muito nas vendas”, analisa.

    Entre os produtos que têm ocupado mais espaço no carrinho dos brasileiros estão os itens higiene pessoal, especialmente papel higiênico e sabonetes antibacterianos, e produtos de limpeza, como detergente, álcool e água sanitária. Na parte de alimentos, um aumento nas vendas de carnes e hortifruti, combinado com a queda expressiva na rotisseria e alimentos prontos, sugere que o consumidor tem cozinhado mais em casa.

    Outro problema é manter regras estipuladas pelas autoridades de saúde e saneamento na hora de atender ao cliente. De acordo com Michelassi, medidas como a fila com afastamento entre um comprador e outro, a esterilização de caixas e carrinhos de compra e outras ações que visam o combate das transmissões do vírus, atrasam e encarecem o processo de venda.

    Com a exceções de farmácias e varejistas de alimentos, outras empresas da plataforma apresentaram uma queda logo no início da quarentena. O movimento é perceptível pelo comportamento da maioria dos consumidores que, se antes ocupava os pontos de vantagem do programa de fidelidade em viagens e lazer, agora direciona os créditos a produtos e serviços essenciais. 

    “O segmento de lazer é o que mais está sofrendo. Do nosso catálogo de prêmios, a procura por viagens caiu 94%. As pessoas estão trocando os pontos por vale compras, recargas de celular, coisas assim”, diz Santoro.

    Uma mudança a ser observada está no comportamento dos idosos neste período. Clientes com mais de 60 anos registraram um aumento de gasto de 29%. As compras feitas por esse público no período noturno antes representavam 16% do total e agora ocupam apenas 5,5%. Em contrapartida, os idosos passaram a ir mais às compras no período da manhã, com um aumento de 18% deste público no turno matutino.

    Vendas online

    Na visão do executivo da Dotz, o momento de crise abre oportunidade para explorar novos métodos de venda e modelos de negócio. O grande bote salva-vidas têm sido as plataformas de vendas online, embora imponham um grande desafio para o segmento que, até pouco tempo, tinha apenas 1% das varejistas do país operando na internet.

     “Quando conversamos com nossos parceiros, o que percebemos é um entendimento que esse momento é de desafio e quem souber passar por ele, pode sair fortalecido. No varejo alimentar, todos estão procurando melhorar muito suas operações de e-commerce”, conta Santoro. 

    No canal digital do programa de fidelidade, o Ganhe Dotz Online (GDO), que reúne mais de 200 empreendimentos de vários setores — como Americanas, Submarino e Shoptime —, o crescimento nas vendas foi de 25% no período.

    “Mas sabemos que se não houver uma retomada logo, as demissões vão acontecer”, diz ele. 

    Nos supermercados que Michelassi administra, esse processo já corre a todo vapor. Ainda sem um site para a venda online dos produtos, o diretor comercial agora tenta fechar uma parceria e colocar as prateleiras de suas lojas no mundo digital. Ele percebeu a tendência depois de ver que as vendas por telefone nas unidades que coordena cresceram 300% durante a quarentena.

    Páscoa

    O movimento também se refletiu durante a Páscoa. A maioria dos clientes definiu um lugar para a compra e já levou doces e ovos de chocolate para toda a família. Dentre os produtos típicos da data, os ovos de chocolate foram os que menos sofreram, enquanto a bomboniere sofreu o maior impacto.

    Santoro explica que, apesar da crise, o brasileiro se mantém apegado a tradições e costumes, o que amortece a queda nas vendas em momentos como esse. “Nosso comportamento, do povo latino, é mais carinhoso, mais próximo. Nessas horas, mesmo que a situação financeira esteja difícil, o cliente leva um presente para a família. O fato de os ovos de chocolate estarem 10% mais baratos ajudou também.”

    De acordo com o executivo da Dotz, indústria e o varejo fizeram um acordo neste ano: os varejistas vão manter ovos de chocolate em exposição por mais tempo depois da Páscoa. Como o prejuízo atinge toda a cadeia, o setor decidiu esperar um pouco mais e avaliar o consumo nos próximos dias. Só então vão determinar o momento de tirar os doces típicos da prateleira e calcular o prejuízo.

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