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    Como um fundo de hedge pouco conhecido causou caos generalizado em Wall Street

    Archegos Capital Manage foi capaz de tomar emprestado tanto capital que seu fracasso criou ondas de choque grandes o suficiente para se espalhar por Wall Street

    Foto: REUTERS/Andrew Kelly

    Por Matt Egan, CNN Business

    Nova York (CNN Business) – Os nomes dos protagonistas são diferentes, mas as lições são semelhantes. A implosão espetacular do fundo de hedge Archegos Capital Management e a saga da rede de lojas de videogame GameStop no início deste ano servem como um lembrete dos perigos para economia representados pela extrema alavancagem, derivativos secretos e taxas de juros baixíssimas.

    As ações da ViacomCBS, da Discovery e de outros titãs da mídia dos Estados Unidos despencaram na sexta-feira (26), quando os bancos de Wall Street que emprestaram ao fundo Archegos forçaram a empresa a se desfazer de suas apostas. O incêndio destruiu mais da metade do valor da Viacom só na semana passada.

    Grandes bancos enfrentam perdas de bilhões de dólares por causa de sua exposição ao Archegos. As ações do Credit Suisse e do Nomura caíram na segunda-feira (29) após os alertas sobre impactos significativos em seus ganhos.

    A parte mais surpreendente da história do Archegos é que se trata de uma empresa da qual poucas pessoas ouviram falar antes deste fim de semana. Mesmo assim, nesta era de dinheiro fácil, o Archegos foi capaz de tomar emprestado tanto capital que seu fracasso criou ondas de choque grandes o suficiente para se espalhar por Wall Street. O impacto chegou até nas contas de aposentadoria dos cidadãos norte-americanos.

    “É um alerta para despertarmos. Com a alavancagem, vem o risco”, resumiu Art Hogan, estrategista-chefe de mercado da National Securities Corporation. “É a segunda vez que aprendemos uma lição neste ano sobre alavancagem”.

    Em janeiro, outro fundo de hedge, Melvin Capital Management, quase entrou em colapso após suas apostas maciças contra a rede de lojas de videogame GameStop explodirem por causa da ação de um exército de investidores individuais reunidos na rede social Reddit. Os investidores ficaram surpresos ao saber do tamanho das posições vendidas, antecipando que o preço das ações do varejista de videogame cairia.

    Quando o valor das ações da GameStop chegou às estrelas, o Melvin Capital sofreu perdas surpreendentes e foi forçado a negociar um resgate de US$ 2,8 bilhões (cerca de R$ 16 bilhões) com rivais maiores.

    “Vimos isso em escala menor quando a GameStop explodiu. Agora, estamos vendo isso em escala maior”, disse Hogan.

    Instrumentos obscuros

    O Archegos Capital estava usando dinheiro emprestado –aparentemente um caminhão de dinheiro– para fazer apostas gigantescas que sustentavam as ações da mídia. Esse tipo de alavancagem excessiva é possibilitado por taxas de juros extremamente baixas do Federal Reserve [o banco central dos EUA].

    A escala total dessas apostas não estava clara até agora.

    Talvez em um esforço para evitar fazer relatórios de divulgação pública de seus resultados, o Archegos supostamente teria usado derivativos conhecidos como swaps de retorno total para mascarar algumas de suas grandes posições de investimento. Investidores que usam os swaps recebem o retorno total de uma ação de um distribuidor e esses retornos são normalmente ampliados pela alavancagem.

    Normalmente, os investidores que têm mais de 5% de um papel são obrigados a relatar a aposta à SEC [Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos]. Mas a documentação não parece ter sido entregue desta vez.

    “Sempre que um derivado está envolvido, não dá para saber até onde seus tentáculos chegam”, comparou Joe Saluzzi, codiretor de negociações da Themis Trading.

    A gota d’água

    A estratégia complexa de usar swaps caiu por terra na semana passada.

    Buscando capitalizar sobre o preço exorbitante de suas ações, a ViacomCBS anunciou planos para uma venda de ações de US$ 3 bilhões (cerca de R$ 17,3 bilhões). Até aquele ponto, as ações da ViacomCBS já haviam quase triplicado no ano. Mas a venda de ações parecia ser demais para o mercado controlar, e o boom da mídia se transformou em uma derrota.

    O Archegos enfrentou chamadas de margem de seus credores de Wall Street. Uma chamada de margem (ou margin call, como é chamada em inglês) feita por um corretor exige que um cliente adicione fundos à sua conta se o valor de um ativo cair abaixo de um nível especificado. Se o cliente não puder pagar (e, neste caso, o Archegos aparentemente não podia), o corretor pode intervir e descartar as ações em nome do cliente.

    O Goldman Sachs, um dos credores do Archegos, apreendeu garantias e vendeu ações na sexta-feira, segundo contou ao CNN Business uma pessoa familiarizada com o assunto. A chamada liquidação forçada desencadeou um massacre na sexta-feira, que derrubou as ações da ViacomCBS e da Discovery em mais de 25% cada uma.

    O Credit Suisse disse que a inadimplência de um “importante fundo de hedge com sede nos Estados Unidos” causaria um grande golpe em seus lucros. Uma pessoa familiarizada com o assunto disse ao CNN Business que o Archegos foi a empresa que causou as perdas para o Credit Suisse.

    O banco Nomura disse que suas perdas podem chegar a US$ 2 bilhões (cerca de R$ 11,5 bilhões) em “transações com um cliente dos EUA”.

    Informações privilegiadas

    O episódio demonstra a intrincada rede que conecta empresas em Wall Street, além dos riscos para os bancos que fornecem grandes quantidades de alavancagem.

    “O risco sistêmico de alavancagem secreta e interconectada, da negociação e dos derivativos em quantias astronômicas não reveladas continua a permear o sistema bancário paralelo”, disse o CEO da Better Markets, Dennis Kelleher, em comunicado.

    Hogan, o estrategista-chefe de mercado da National Securities Corporation, disse que os investidores devem se lembrar dos riscos inerentes às linhas de negócios dos bancos.

    “Os investidores observam a capacidade de crédito dos clientes, mas nem sempre ela é perfeita”, afirmou.

    A questão central nesse caso é a capacidade de captação de recursos do Archegos. Bill Hwang, fundador da empresa e um protegido do pioneiro de fundos de hedge Julian Robertson, esteve envolvido anos atrás em um escândalo de negociação com informações privilegiadas no Tiger Asia Management, um fundo de hedge fundado por ele.

    Em 2012, a SEC alegou que o Tiger Asia havia levantado quase US$ 17 milhões (cerca de R$ 98 milhões) em lucros ilegais em um esquema envolvendo ações de bancos chineses. Hwang se declarou culpado naquele ano em nome do Tiger Asia em uma acusação de fraude eletrônica. O Tiger Asia foi condenado a um ano de suspensão e condenado a renunciar a mais de US$ 16 milhões (cerca de R$ 92 milhões).

    Na esteira do escândalo de insider trading, o Goldman Sachs parou de fazer negócios com Hwang por um período, segundo uma fonte. No entanto, o Goldman Sachs mais tarde retomou um relacionamento com Hwang, atuando como um dos credores de sua empresa.

    Memórias ruins

    A explosão do fundo Archegos Capital traz de volta as más lembranças do Long-Term Capital Management, um fundo de hedge imenso que colapsou em 1998, ameaçando o sistema financeiro e forçando o governo federal a intervir.

    “O caso atual provavelmente não é como o Long-Term Capital”, disse Hogan, citando reformas no sistema financeiro que significam que os bancos correm menos riscos do que antes da crise de 2008. “Não acho que seja a ponta do iceberg”.

    Saluzzi, o executivo da Themis Trading, não tem certeza ainda, apontando como os mercados inicialmente desprezaram o colapso dos fundos de hedge Bear Stearns no verão de 2007.

    “Não sabemos até onde vão os tentáculos”, disse Saluzzi. “No início da crise do Bear Stearns, o mercado estava bem –e de repente não estava mais”.

    Jill Disis, da CNN, contribuiu para esta reportagem

    (Texto traduzido. Clique aqui para ler o original em inglês).

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