Com bebê no colo e app a mil: quem é a mulher mais jovem da história a fazer IPO
Aos 31 anos, Whitney Wolfe Herde, do app de namoros Bumble, tornou-se a mulher mais jovem a abrir IPO — e tudo isso com seu filho de um ano no colo
O vídeo caiu no gosto das pessoas na internet: em uma gravação que durou apenas alguns segundos, Whitney Wolfe Herd, fundadora do aplicativo de relacionamentos Bumble, fez a estreia da empresa na bolsa de valores dos EUA com seu filho de um ano, Bo, em seu colo.
Herd, que é a mulher mais jovem da história a ter uma empresa de capital aberto, quis criar o app com a premissa inicial de dar às mulheres o poder de decidir como, quando e se querem continuar a ter uma conversa com as demais pessoas cadastradas na plataforma.
Antes do Bumble e de seu IPO, Herd cofundou o famoso Tinder, aplicativo de relacionamentos no qual qualquer pessoa inicia uma conversa, seja ela homem ou mulher.
Ela conta que sua saída do Tinder não foi fácil. Dos comentários de ódio e assédio de estranhos na internet, veio a vontade de “resolver o comportamento tóxico online”. Foi então que, no mesmo ano, fundou o Bumble.
“A criação do Bumble foi realmente eu tentando resolver o problema do comportamento online tóxico que perpetuava a dinâmica arcaica dos gêneros”, disse, em entrevista exclusiva ao CNN Brasil Business.
abriu meus olhos para o grande problema do online e para a necessidade de um espaço na internet mais seguro e gentil. Vi uma grande oportunidade para mudar a maneira como as pessoas se tratavam digitalmente e, por fim, criei o Bumble para proporcionar um espaço onde as pessoas possam interagir com gentileza e respeito.”]
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Até o momento, o Bumble tem 42 milhões de usuários ativos mensais, com diversos objetivos, que vão desde um encontro amoroso até networking profissional.
As mulheres foram as primeiras a dar o passo inicial para uma conversa 1,7 bilhão de vezes. E todos esses números também deram resultados financeiros: em 2020, a receita da empresa foi de mais de US$ 500 milhões.
A mais jovem da história
“Sinceramente, não acho que seja um bom sinal. Fico um pouco triste por ser a mais nova a abrir IPO”, diz Herde, chateada com o posto de mulher mais jovem do mundo a abrir o capital de sua empresa, aos 31 anos de idade.
Em 2020, cerca de 442 companhias americanas abriram capital. Apenas duas são lideradas por mulheres, segundo uma pesquisa do site Business Insider e da bolsa Nasdaq. Historicamente, apenas 20 das companhias que fizeram IPO tinham mulheres em cargos mais altos.
É por isso que, para Herd, o fato, apesar de ser importante, indica um problema muito maior na sociedade: a falta de espaço que as mulheres ainda têm nas grandes companhias.
Quando você olha para os homens que abriram o capital de empresas de tecnologia, eles o fizeram na casa dos 20 anos de idade, e acho que isso é um reflexo do financiamento que conseguem obter e da aceitação social de que talvez abandonem a escola ou aceitem um caminho não tradicional profissionalmente.
Whitney Wolfe Herd, fundadora do Bumble
“Acho que algumas mulheres ainda enfrentam uma tremenda pressão para seguir um ‘caminho esperado’ ou ‘aprovado’, e isso realmente as coloca nesse lugar de impossibilidades de abrir o capital da empresa desde cedo”, reflete.
“Não é nenhum segredo que o mundo dos negócios tem sido tradicionalmente dominado por homens, e que muitas líderes e fundadoras mulheres foram deixadas de fora por muito tempo. Entre todas as empresas que abriram capital no ano passado, foi triste perceber que o Bumble foi uma das poucas lideradas por mulheres que chegaram a este ponto emocionante em nossa jornada de crescimento”, diz.
Herd afirma que a situação só vai melhorar quando as empreendedoras tiverem o mesmo acesso que os homens “às ferramentas e recursos para levar seus negócios para o próximo patamar”.
Em plena ano de 2021, isso ainda não acontece. Segundo o Pitchbook, apenas 2,7% dos dólares de capital de risco vão para companhias fundadas para mulheres. O resto, como em um “clube do bolinha”, continua beneficiando apenas homens.
“E sabemos que esse número cai ainda mais quando falamos de outras mulheres de grupos sub-representados, como negras e latinas”, diz Herd.
O foco do Bumble em mulheres aparece também na hora da contratação de seus funcionários. São mais de 700 funcionários no mundo todo, sendo que 73% do conselho da empresa é composto por mulheres, e elas também ocupam mais de 50% dos cargos de liderança.
“Mulheres — e pessoas de todos os gêneros — merecem se sentir seguras online e ter acesso a espaços que foram construídos pensando nelas. No Bumble, temos a missão de criar um mundo onde todos os relacionamentos sejam saudáveis e igualitários. E uma grande parte disso existe nos espaços onde vivemos nossas vidas online”, diz.
A maternidade, o capital e o trabalho
Adicione a maternidade à pandemia do novo coronavírus e a uma vida profissional cheia de desafios e esse se torna, rapidamente, o retrato da vida de muitas mulheres no mundo todo.
Uma pesquisa feita pelo Pew Research Center, por exemplo, apontou que 18% das mães afirmam que estar com as crianças em casa enquanto trabalham é “muito difícil” e outras 39% definiram a situação como “um pouco difícil”. Entre os pais, o número cai para 11% e 36%, respectivamente.
Foi assim com Herd. Com o filho no colo, a empreendedora fez o IPO de sua companhia. No Instagram, o primeiro comentário do vídeo diz: “é o seu bebê no colo enquanto você domina o mundo para mim”.
“Iniciar minha jornada de maternidade enquanto liderava um time global passando por um processo de IPO durante uma pandemia foi diferente de qualquer desafio que já lidei antes. O que me ajudou a passar por toda essa jornada foi me lembrar de que não há problema em não atingir um equilíbrio perfeito entre as duas funções e pedir ajuda quando eu preciso”, diz.
Eu também aprendi que é possível equilibrar ser uma CEO e uma mãe de primeira viagem se eu focar em minhas prioridades, reconhecendo o poder de me permitir ser vulnerável e buscando apoio quando me sentir sobrecarregada.
Whitney Wolfe Herd, fundadora do Bumble
Herd espera que a sua atitude se torne referência para outras mulheres, lembrando-as “de que você não precisa escolher entre uma coisa ou outra quando se trata de construir uma família e uma carreira.”
Leia a entrevista na íntegra:
- Como o Bumble foi criado e por que focar em mulheres?
Antes de lançar o Bumble, eu estava vindo de um lugar onde vi um monte de coisas que estavam erradas em termos de como as normas de gênero existentes para relacionamentos amorosos estavam influenciando o comportamento das pessoas online.
A criação do Bumble foi realmente eu tentando resolver o problema do comportamento online tóxico que perpetuava a dinâmica arcaica dos gêneros.
As mulheres ouviram por muito tempo que deveriam sentar e esperar que alguém se aproximasse delas, porque, se você fosse atrás do que queria ou se pedisse a um cara o número de telefone dele, isso significaria que você era “louca”, “carente” ou qualquer outro termo negativo.
Descobrimos que, ao dar o primeiro passo, a mulher tem a chance de definir o tom da conversa, nivelando o campo de jogo e promovendo a igualdade desde o início.
- Quantos usuários vocês têm? Como está a companhia em termos financeiros?
O Bumble tem mais de 42 milhões de usuários ativos mensais, pessoas que estão ativamente procurando criar conexões significativas seja em amor, amizade e/ou networking profissional. Até o momento, as mulheres deram o primeiro passo mais de 1,7 bilhão de vezes no Bumble.
O aplicativo pode ser baixado gratuitamente e está disponível em todo o mundo na App Store e no Google Play. Nossa receita em 2020 foi de mais de US$ 500 milhões.
- Qual é a porcentagem de mulheres no quadro de funcionários de vocês?
Nós temos mais de 700 funcionários em todo o mundo. O conselho do Bumble é composto 73% por mulheres, e mais de 50% dos nossos cargos de liderança são ocupados por mulheres.
- Como foi pavimentada a jornada para fazer o IPO?
Iniciar minha jornada de maternidade enquanto liderava um time global passando por um processo de IPO durante uma pandemia foi diferente de qualquer desafio com que já lidei antes.
O que me ajudou a passar por toda essa jornada foi me lembrar que não há problema em não atingir um equilíbrio perfeito entre as duas funções e pedir ajuda quando eu preciso.
Eu também aprendi que é possível equilibrar ser uma CEO e uma mãe de primeira viagem se eu focar em minhas prioridades, reconhecendo o poder de me permitir ser vulnerável e buscando apoio quando me sentir sobrecarregada.
Não é uma tarefa fácil, mas espero que minha história ajude a mostrar a outras mulheres por aí que você não precisa escolher uma coisa em vez da outra quando se trata de construir uma família e uma carreira.
- Onde você estava quando o Bumble se tornou uma empresa de capital aberto?
Eu toquei o sino no nosso escritório em Austin, no Texas, com meu filho de 1 ano, Bo, no meu colo.
- Você sente que as mulheres têm mais espaço na indústria de tecnologia hoje?
Não é nenhum segredo que o mundo dos negócios tem sido tradicionalmente dominado por homens, e que muitas líderes e fundadoras mulheres foram deixadas de fora por muito tempo.
Entre todas as empresas que abriram capital no ano passado, foi triste perceber que o Bumble foi uma das poucas lideradas por mulheres que chegaram a este ponto emocionante em nossa jornada de crescimento.
É muito importante dar às mulheres empreendedoras o mesmo acesso às ferramentas e recursos para levar seus negócios para o próximo patamar. Infelizmente, essas mulheres empresárias receberam apenas 2,7% de investimentos em 2019, e sabemos que esse número cai ainda mais quando falamos de outras mulheres de grupos sub-representados, como negras e latinas.
Como uma empresa que se preocupa profundamente com o empoderamento feminino, queríamos fornecer uma solução para esta questão do desequilíbrio de gênero no mundo do capital de risco. Então, lançamos o Bumble Fund em 2018.
O Bumble Fund é o nosso fundo de investimentos para negócios em estágios iniciais com foco principalmente em empresas fundadas e lideradas por mulheres não brancas e de outros grupos sub-representados. Continuaremos este trabalho de apoiar aqueles que são menos representados no setor e esperamos que outras empresas façam o mesmo.
- O que mudou desde a criação de vocês, em 2014?
Sempre vimos uma oportunidade incrível no mercado. Relacionamentos são essenciais para nossa saúde e felicidade -e o Bumble é uma ferramenta que foi criada para ajudar as pessoas a construírem esses relacionamentos, sejam eles de amor (Bumble Date), amizade (Bumble BFF) e/ou networking profissional (Bumble Bizz).
Além disso, pela maneira como o Bumble foi capaz de se adaptar aos desafios que surgiram com o surto de pandemia, mostramos a durabilidade do nosso negócio. Agora, mais do que nunca, as pessoas estão ansiosas para encontrar conexões significativas após passarem por meses de solidão e isolamento durante o distanciamento social.
Particularmente, percebemos um aumento nos níveis de engajamento dentro do aplicativo com os recursos de encontros online —como chamada de voz e de vídeo—, e tivemos um aumento de quase 70% no uso de chamadas de vídeo depois que o estado de emergência foi declarado na primavera passada nos Estados Unidos.
Além disso, o tempo médio gasto em uma chamada de voz ou de vídeo foi de cerca de 30 minutos durante aquele período. Como chegamos a mais de um ano com restrições e distanciamento social, é emocionante ver um forte senso de esperança e otimismo em nossa comunidade ao usar ferramentas digitais como o Bumble para continuarem conectados.
- Por que construir uma “internet feminina”?
Mulheres — e pessoas de todos os gêneros — merecem se sentir seguras online e ter acesso a espaços que foram construídos pensando nelas.
No Bumble, temos a missão de criar um mundo onde todos os relacionamentos sejam saudáveis e igualitários, e uma grande parte disso existe nos espaços onde vivemos nossas vidas online.
- Como foi que você chegou onde está agora?
Após sair do Tinder, uma empresa que cofundei, fui submetida a muito ódio e assédio de estranhos online.
Essa experiência abriu meus olhos para o grande problema do comportamento tóxico online e para a necessidade de um espaço na internet mais seguro e gentil.
Vi uma grande oportunidade para mudar a maneira como as pessoas se tratavam online e, por fim, criei o Bumble para proporcionar um espaço onde as pessoas possam interagir com gentileza e respeito.
- Você é a mulher mais jovem da história a fazer IPO. Isso é um bom sinal?
Sinceramente, não acho que seja um bom sinal. Fico um pouco triste por ser a mais nova a abrir IPO.
Quando você olha para os homens que abriram o capital de empresas de tecnologia, eles o fizeram na casa dos 20 anos de idade, e acho que isso é um reflexo do financiamento que conseguem obter e da aceitação social de que talvez abandonem a escola ou aceitem um caminho não tradicional profissionalmente.
Acho que algumas mulheres ainda enfrentam uma tremenda pressão para seguir um “caminho esperado” ou “aprovado”, e isso realmente as coloca nesse lugar de impossibilidades de abrir o capital da empresa desde cedo.
- O que está por vir para o Bumble? E para você?
Estamos em uma fase emocionante de crescimento no Bumble e temos explorado como continuar a expandir nossa missão para ajudar as pessoas a construírem relacionamentos saudáveis e igualitários em todos os cantos do mundo.
O Brasil é um mercado que tem mostrado grande receptividade para plataformas de redes sociais como o Bumble. É também um lugar onde estamos ansiosos para apresentar nosso produto de uma forma que seja culturalmente relevante, aplicando os insights e aprendizados de outro produto central de nossa família Bumble, o Badoo.