Por um acaso você já ouviu falar em hipergamia?
Resumidamente, é o relacionamento por interesse. Mas por que gourmetizaram esse negócio que já existe desde sempre?
Nos últimos dias, quando eu ouvi falar sobre esse termo pela primeira vez, eu achava que era algo como alguém que basicamente pega geral. O sufixo “gamia” me levou direto pro universo da monogamia, que é o relacionamento com um único parceiro ou parceira, e da poligamia, o relacionamento com vários seres humanos ao mesmo tempo.
Nessa linha de raciocínio, a hipergamia seria, na minha cabeça, alguém que sai ficando com o máximo possível de pessoas, sem medo de ser feliz. Mas não é o caso. Lendo a respeito, eu descobri que o “hipergâmico” é, basicamente, um monogâmico com um gosto específico e bastante seletivo.
No geral, praticar a hipergamia é decidir se relacionar com pessoas quem tem mais grana e/ou mais poder do que você. Ou seja, um comportamento que não tem absolutamente nenhuma novidade.
Não é surpresa pra ninguém que antigamente vários casamentos eram arranjados. No século 19, muito se falava em “dotes” pra família da noiva, que era basicamente grana ou propriedades que os pais do noivo transferiam pros pais dela.
Aliás, eu acabei de assistir a um filme na Netflix que chama “Donzela“, com a Millie Bobby Brown. Ela interpreta a princesa de um reino decadente e é entregue pelo pai pra se casar com o príncipe de um reino vizinho em troca de muito ouro e terras. Mas a história se passa numa antiguidade ficcional. Nem o cinema e as produções audiovisuais parecem considerar isso uma prática comum de hoje em dia.
Eu entendo que os tempos de dotes eram outros totalmente diferentes, mas eu sempre achei esse negócio extremamente bizarro. É como colocar um preço num ser humano, quantificar o valor necessário pra atrair essa mulher pra dentro desse relacionamento, independentemente da vontade dela. O mais surreal é que o preço era sempre dela, nunca dele.
Como as mulheres mais jovens de antigamente não raramente ajudavam bastante no trabalho doméstico, os dotes podiam servir, por exemplo, pra compensar a família pela perda dessa mão de obra dentro de casa. Mas também eram vistos como um tipo de antecipação de herança que a família dela podia usufruir com antecedência. Mas, de novo, eu tenho muita dificuldade de achar isso minimamente razoável com a minha cabeça de hoje.
O fato é que, nessa época, os casamentos por interesse eram comuns e corriqueiros. Mas, durante a minha vida, eu sempre aprendi que isso não era mais bem visto na nossa sociedade. A decisão de manter qualquer tipo de relação com alguma pessoa tinha que ser tomada com o coração, nunca com a carteira. Alguém que tivesse dentro de um relacionamento com suspeita de ser por interesse era, quase sempre, alvo de olhares desconfiados e comentários maldosos.
Pra vocês entenderem como a possibilidade de casamento por interesse virou algo demonizado, até o começo desse ano, o nosso Código Civil brasileiro proibia casamentos envolvendo pessoas com mais de 70 anos com comunhão total de bens. A justificativa pros especialistas era proteger idosos em posição de vulnerabilidade de possíveis golpes do baú. Uma regra que o Supremo Tribunal Federal derrubou há seis meses, em fevereiro.
E por que a gente tá falando sobre isso agora? Porque uma pesquisa recente mostrou que quase a metade dos americanos acha de boa um relacionamento em que o objetivo é se envolver com alguém que vai trazer esses benefícios diretos. São dados coletados pelo Talking Research, a pedido do Seeking, que é um app de relacionamentos.
Aí resolveram dar um nome bonito pra uma prática tão antiga e, até onde eu sabia, condenável pela sociedade atual. Nos últimos dias, o assunto entrou na lista dos temas do Google de mais interesse no nosso país, e o portal britânico The Sun também falou a respeito.
Eu não sei se eu sou muito ingênuo ou muito tonto, mas eu sigo achando esquisita essa história de namorar ou casar com alguém só pela grana ou pelo status que aquela pessoa tem.
O mais estranho de ler são textos que ainda apontam a hipergamia como um fenômeno majoritariamente feminino, o que me parece essencialmente bastante machista. Principalmente porque hoje, ainda bem, as mulheres conseguiram conquistar direitos que não existiam no passado, independência e uma capacidade cada vez mais latente de empoderamento.
Mas o caminho ainda é longo, infelizmente elas ainda ganham quase 20% a menos do que os homens, e essas diferenças de salário tão em 8 de cada 10 áreas de atuação.
E, ó, só pra deixar claro: tudo que eu disse aqui pode ser só a opinião de um cara careta de quase meia idade que não entende muito bem os novos modelos de relacionamento que vem se desenhando. Mas nada me tira da cabeça que o melhor jeito de querer tá com alguém é olhar praquela pessoa e saber que o que te motiva a querer tá o tempo todo com ela é o que ela tem dentro do peito… e não dentro da carteira ou escrito na descrição do LinkedIn.
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