Em teste desde o começo do ano, semana com 4 dias úteis funcionou no Brasil
O projeto piloto feito com 21 empresas teve uma aprovação de 97,5% de quem participou. E aí… cê queria isso na tua rotina?
O ano era 2001. Eu tava no último ano do ensino médio e tinha acabado de completar 16 anos, a idade permitida pra tirar a Carteira de Trabalho. A essa altura, eu já tava doido de vontade de fazer faculdade e sabia que precisava começar a trabalhar o quanto antes pra, em primeiro lugar, juntar grana pra comprar o computador que eu precisava pra estudar, e, em segundo lugar, pra pagar as mensalidades.
Foi aí que logo eu consegui meu primeiro emprego formal como empacotador num mercadinho de bairro, que ficava quase em frente à escola onde eu estudava.
De uma hora pra outra, eu senti o tranco de uma rotina que me dava só dois domingos de folga no mês. Em todos os outros dias, eu trabalhava. Apesar de ter sido isso que me deu as primeiras noções de responsabilidade profissional, que eu carrego até hoje, trabalhar tanto, durante tantos dias seguidos, era algo que eu logo percebi ser pouco sustentável.
Quase todos os colegas que compartilhavam essa mesma rotina – principalmente os mais velhos – eram infelizes, pouco saudáveis e não demonstravam absolutamente nenhum prazer em fazer aquilo, o único objetivo era receber um salário no fim do mês.
Mesmo depois de formado, eu demorei 15 anos até conseguir ajustar a minha rotina pra uma realidade em que trabalhar aos fins de semana fosse algo raro. A carreira de jornalismo tem o tal do plantão que, via de regra, é o terror da nossa categoria.
Isso sem falar em todos os anos em que eu vivi um dia a dia em que eu tinha que esperar até às 21h pra receber uma escala por e-mail e saber que horas eu trabalharia no dia seguinte. E meu horário de entrada poderia ser qualquer coisa no intervalo entre 5h e 18h. Não, não é exagero. Era impossível ter a certeza de poder ir a uma consulta médica, a um curso ou aula de pós-graduação, por exemplo.
Com o passar dos anos, isso foi me adoecendo e não foi pouco. Não quero aqui ficar reclamando da vida, não me entende errado, por favor. Eu sou muito, muito grato a absolutamente todos os lugares onde eu trabalhei e cresci tanto pessoalmente quanto profissionalmente. Foram escolhas minhas.
Mas é fato que rotinas tão pesadas como essas não são sustentáveis por muito tempo, principalmente quando a gente vai ficando mais velho e quer, entre outras coisas, cuidar da própria família e de si mesmo. Eu só queria trabalhar de segunda a sexta, em horário fixo, a realidade pra maioria dos profissionais… pelo menos por enquanto.
É que uma semana com 5 dias úteis pode já não ter mais tanta justificativa, pelo menos pelo que mostra um projeto piloto que acabou de trazer os primeiros resultados práticos aqui no Brasil. Eu tô falando de uma parceria que foi feita entre duas instituições: a 4 Day Week Global e a filial brasileira dela, a Reconnect Happiness at Work.
O resultado do experimento foi divulgado agora em agosto com ajuda da FGV, a Fundação Getúlio Vargas, e a conclusão é bem interessante pra quem acha que trabalhar menos pode, sim, ser viável.
Esse negócio já tá sendo testado em mais de 500 empresas ao redor do mundo e propõe um modelo que os pesquisadores chamam de 100-80-100, porque o trabalhador recebe 100% do salário, trabalha 80% do tempo, mas se compromete a manter 100% da produtividade.
No ano passado, as instituições que se propõem a promover o teste escolheram 21 empresas que toparam o desafio. Dessas, só duas não concluíram o processo. Uma do Rio Grande do Sul, que foi atingida pelas enchentes, e outra que teve uma mudança grande de direção e desistiu do processo. Das 19 que ficaram até o fim, todas decidiram continuar até o fim do ano com a semana de 4 dias, com aprovação de 97,5% dos funcionários.
Pode parecer meio óbvio que os funcionários aprovem um dia a menos de trabalho na semana, mas o fato das empresas concordarem em estender a iniciativa até o fim do ano mostra que a eficiência foi mantida. Nenhum empresário seria maluco de seguir com um projeto que deixou os funcionários felizes, mas ameaçou quebrar a companhia.
Segundo os responsáveis por compilar os dados recebidos pelas empresas, os maiores desafios se concentraram na otimização das tarefas e dos processos pra que a produtividade aumentasse durante os 4 dias de trabalho da semana. Mas a experiência mostrou que isso foi possível.
Não que os funcionários precisassem correr desesperadamente pra deixar tudo pronto até o fim da quinta-feira, mas saber que a sexta é de folga, obviamente, faz com que as idas ao cafézinho e os almoços em grupo sejam mais curtos.
Os funcionários que participaram do estudo gostaram tanto da experiência que relataram mais satisfação na hora de ir trabalhar. De cada 100 profissionais, 87 disseram que ficaram com mais energia pra trabalhar, e 73 não tiveram mais aquele sentimento constante de exaustão. A gente tá falando de um universo de pouco menos de 300 profissionais.
Por mais que seja um piloto em empresas relativamente pequenas, é uma iniciativa que dá um chacoalhão e faz a gente pensar nos caminhos que a gente tá trilhando em rotinas que parecem ser a única opção possível, mas talvez não sejam. Trabalhar menos dias por semana talvez – e só talvez – seja uma oportunidade de ter profissionais que se sintam menos sobrecarregados num país que, segundo a Organização Mundial da Saúde, tem os maiores índices de ansiedade do mundo.
Não que trabalhar menos dias na semana seja a solução definitiva de todos os nossos problemas, mas os números mostram que pode, sim, ser um caminho. E não reconhecer isso pode ser o mesmo que se conformar com uma realidade estabelecida que, claramente, não tá criando uma geração de trabalhadores saudáveis.
E você? O que cê acha dessa história? Fala com o seu líder sobre isso. Quem sabe ele não se anima a fazer o teste?! As inscrições pro piloto da semana de 4 dias em 2025 já tão abertos nesse link. Vai que dá certo pra sua empresa…
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