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    Pedro Côrtes
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    Pedro Côrtes

    Professor titular da Universidade de São Paulo (USP) e um dos mais renomados especialistas em Clima e Meio Ambiente do país.

    Trump e o Fórum Econômico Mundial em Davos

    Na semana da posse de Donald Trump, ocorre também o Fórum Econômico Mundial, em Davos. Não é difícil prospectar quem dominará a agenda e isso gera implicações

    O encontro anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos, entre os dias 20 e 24, terá como tema Colaboração para uma Era Inteligente (Collaboration for the Intelligent Age). Ela concorre, em termos de agenda, com o início do mandato de Donald Trump.

    Embora a posse ocorra no dia 20, é plausível considerar que os primeiros atos de Donald Trump dominarão a agenda nas próximas semanas. Há muitas promessas feitas ao longo e após a campanha e fica a dúvida quantas delas serão efetivamente colocadas em prática e com qual intensidade.

    As primeiras medidas indicadas por Donald Trump, se concretizadas, concorrerão com a agenda proposta pelo Fórum Econômico Mundial de 2025 e elas caminham em sentidos divergentes. Não parece haver meio-termo de conciliação entre elas.

    Fórum Econômico Mundial

    Ao enunciar a colaboração para uma era inteligente, o Fórum em Davos indica cinco temas centrais. Trabalha com a perspectiva de reconstruir a confiança por meio da cooperação internacional e reimaginar o crescimento econômico com novas oportunidades. Considera a necessidade de investir no desenvolvimento humano e na geração de empregos de qualidade. Divisa a necessidade de proteger o planeta com ações voltadas à energia, clima e natureza. Finaliza com a necessidade de preparar as indústrias para a era inteligente, buscando equilibrar metas de curto e longo prazo.

    É uma pauta que manifesta preocupações com o crescimento do protecionismo internacional, marcado por um cenário geopolítico multipolar isolacionista e pelas divisões sociais crescentes. O relatório “The Global Cooperation Barometer 2025, 2ª ed.”, publicado pelo Fórum Econômico Mundial em cooperação com a McKinsey & Company, considera que os setores público e privado precisam aprofundar a cooperação em propósitos globais.

    Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça
    Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça • World Economic Forum/Mattias Nutt

    Há objetivos que esses campos não podem atingir sozinhos. No entanto, segundo o relatório, tal cooperação pode se tornar ilusória, pois o mundo parece prestes a entrar em um período de instabilidade e volatilidade, com incertezas políticas e geopolíticas.

    Como o cenário está mudando rapidamente, as estratégias históricas de cooperação provavelmente serão menos eficazes do que antes. Essas divisões têm se acentuado com o crescimento de movimentos ultranacionalistas e xenofóbicos que pretendem isolar nações. Derrubam pontes e constroem muros.

    Com espaço fiscal limitado e ferramentas de política monetária restritas, os formuladores de políticas precisam, segundo os organizadores do Fórum, reimaginar e impulsionar o crescimento para fortalecer economias. Consideram isso em um contexto de colaboração entre empresas, governos e sociedade civil. Pensam em um cenário de certa forma idílico em que acordos de livre-comércio possam ser celebrados, criando pontes que perpassem os muros entre nações.

    O Fórum avança ao considerar que um dos desafios mais urgentes é requalificar e aperfeiçoar trabalhadores para atender às demandas da economia atual e futura e aproveitar os novos empregos em áreas emergentes de maior valor agregado. Isso exige, entretanto, maciços investimentos sociais, em educação, distribuição de renda, saúde, habitação e segurança.

    A requalificação é necessária, mas nem sempre estará acessível a quem mais precisa. Como fazer é algo que precisa ser discutido. Envolve recursos que, provavelmente, não estarão fartamente disponíveis. Algo como um financiamento social similar ao financiamento climático. A ideia é boa. Mas, na prática, não se realiza.

    Sobre as questões climáticas, os organizadores do Fórum consideram necessário fortalecer parcerias e mobilizar mais capital para acelerar a descarbonização, promover a circularidade e resiliência dos sistemas provedores de recursos. A colaboração entre empresas, governos e sociedade civil, liderada pelo Fórum Econômico Mundial, pode catalisar ações climáticas de certo impacto.

    Esse tipo de colaboração não é difícil de lograr êxito, mas em escalas mais modestas. Não é possível divisar uma coalizão internacional efetiva. Isso foge ao escopo da reunião em Davos e é tema para a COP30.

    Donald Trump

    O presidente americano se apresenta com uma agenda diversa. Trump pretende implementar medidas como intensificar deportações de imigrantes em situação irregular, aparentemente sem considerar os impactos que isso poderá gerar na economia americana. Não há nada que se assemelhe à ideia de requalificar trabalhadores para atender às demandas da economia. A agenda de Trump não vislumbra nada similar.

    Pretende impor tarifas sobre importações de países como China, Canadá e México, como uma forma de proteger a indústria americana. Fica a dúvida sobre em que medida isso será realizado, uma vez que tem um grande potencial de encarecer produtos no mercado americano e aumentar a inflação.

    A perspectiva de uma colaboração entre empresas, governos e sociedade civil para reimaginar e impulsionar o crescimento e fortalecer economias (exatamente no plural) é algo sequer pressuposto na agenda do novo presidente.

    Trump pretende priorizar a produção e o uso de combustíveis fósseis, desconsiderando a necessidade e demanda mundial de novas tecnologias que acelerem a transição energética. Ao desistir de participar dessa tendência mundial, pode alijar os EUA do desenvolvimento e comercialização de soluções para o uso de fontes renováveis. Há empresas americanas que persistirão no desenvolvimento de tecnologias de transição, mas um mercado interno desaquecido vai arrefecer iniciativas.

    Embora a retirada dos EUA do Acordo de Paris seja considerada certa, pois foi o que ele fez em seu primeiro mandato, é factível considerar uma permanência para interferir na agenda das cúpulas do clima.

    As possibilidades de influência geopolítica crescem, não necessariamente com a materialização de propostas de anexação do Canadá ou compra da Groenlândia, mas com algum tipo de regulação dos fluxos marítimos no Canal do Panamá, por exemplo. Fica aberta a expectativa sobre o fim da guerra na Ucrânia e o encaminhamento do conflito entre China e Taiwan, por exemplo.

    Caminhos diversos

    Como é possível constatar, o Fórum Econômico Mundial e a chegada de Donald Trump à presidência acontecem com pautas divergentes. As proposições em Davos são bem-intencionadas. Conceitualmente, há boas propostas. A sua viabilidade é uma questão sequente, mas talvez não seja discutida.

    Trump, por outro lado, personifica o “cara malvado”. É essa persona que seu eleitorado espera encontrar na presidência para resolver problemas reais ou imaginários. As propostas, caso executadas na intensidade sugerida, levarão a um cenário bem diverso do atual. Ele pretende participar da reunião em Davos por videoconferência. A ver.

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