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    Lourival Sant'Anna
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    Lourival Sant'Anna

    Analista de Internacional. Fez reportagens em 80 países, incluindo 15 coberturas de conflitos armados, ao longo de mais de 30 anos de carreira. É mestre em jornalismo pela USP e autor de 4 livros

    Mercado coloca em xeque estratégia americana na disputa com a China

    Cinco dias depois de Trump anunciar investimentos de US$ 500 bilhões em IA, uma das principais empresas americanas da área perde mais que isso em valor

    A forte queda no valor das ações da fabricante americana de semicondutores para inteligência artificial Nvidia, que derrubou os mercados ao redor do mundo nessa segunda-feira (27), tem um forte significado geopolítico. Cinco dias depois de o presidente Donald Trump anunciar investimentos de US$ 500 bilhões ao longo de cinco anos em data centers para apoiar empresas americanas de inteligência artificial (IA), a publicação de um paper sobre uma solução criada pela chinesa DeepSeek levou a Nvidia a perder mais que isso em valor em um só dia: US$ 589 bilhões.

    Os grandes modelos de linguagem (LLM, na sigla em inglês) criados pelas empresas chinesas são quase tão bons quanto os americanos, segundo especialistas, e têm um custo muito mais baixo. O modelo R1, anunciado pela DeepSeek no dia 20, dia da posse de Trump, teria custado cerca de US$ 6 milhões para ser desenvolvido, enquanto os modelos americanos consomem dezenas ou até centenas de milhões de dólares.

    Outra empresa chinesa, QWQ, pertencente ao grupo Alibaba, lançou em novembro um LLM que, segundo os especialistas, estava apenas três meses atrás dos americanos.

    Além de mais barato, o R1 consome menos energia, um ativo estratégico na disputa por supremacia entre Estados Unidos e China.

    A IA tem consumo intenso de eletricidade. Essa é uma das justificativas para a decisão de Trump de derrubar o banimento da exploração de petróleo e gás offshore, instituído por seu antecessor, Joe Biden — além, é claro, do desdém do novo presidente pelo combate às mudanças climáticas.

    A capacidade instalada em energia solar e eólica adquirida pela China em 2024 equivale a dois terços de toda a capacidade do mundo. Por outro lado, a China também consome mais carvão, o mais poluente dos combustíveis fósseis, do que todos os outros países somados.

    Como os chineses são os maiores fabricantes de placas solares e de componentes para os parques eólicos, a rejeição de Trump a essas fontes renováveis de energia também tem um componente geoeconômico.

    A crescente competitividade chinesa em IA expõe a enorme complexidade dessa disputa. Em outubro de 2022, Biden assinou uma lei que baniu o acesso da China aos semicondutores mais avançados, e também à tecnologia de impressão a laser desses chips, cujas patentes são controladas pelos Estados Unidos, em conjunto com Holanda, Japão e Coreia do Sul. Várias empresas desses países, incluindo a Nvidia, criticaram essa medida, por considerá-la um incentivo para a China investir maciçamente no desenvolvimento de suas próprias tecnologias. Foi exatamente o que aconteceu.

    De novo, existe aqui mais uma implicação geopolítica: 90% desses semicondutores são usinados em Taiwan. O banimento representa também um incentivo para a China tomar a ilha à força.