Quem vai decidir a eleição americana, e por quais motivos?
Indecisos dos estados-pêndulo pesam sua decisão entre inflação, imigração, aborto e democracia
A terça-feira da eleição americana chegou, precedida de 78 milhões de votos antecipados, mais da metade dos 150 milhões de eleitores registrados. Incontáveis pesquisas e reportagens com os eleitores conduzem à mesma conclusão: a indefinição. Mas é possível ao menos saber quem são, onde estão, o que motiva e o que perturba os decisores – os independentes dos estados-pêndulo.
De acordo com todas as pesquisas, o custo de vida e os rumos da economia são a principal preocupação dos eleitores, seguidos pela imigração, o direito ao aborto e a democracia. Os três primeiros temas favorecem o ex-presidente Donald Trump, enquanto os dois últimos beneficiam a vice-presidente Kamala Harris.
Ora, mas se os americanos dizem confiar mais em Trump no que diz respeito a suas prioridades, por que a eleição não está claramente ganha para ele?
Porque Trump sofre de uma rejeição muito maior do que Harris, e só comparável à do presidente Joe Biden, que por isso mesmo abandonou a disputa.
Os motivos da rejeição são múltiplos, relacionados com condutas pessoais e declarações de Trump, e também com os dois temas que impulsionam a candidatura de Harris.
O ex-presidente se vangloria de ter eliminado o direito ao aborto no nível nacional, graças à nomeação de três juízes conservadores da Suprema Corte, que se somaram a outros três e formaram maioria no tribunal de nove magistrados.
A derrubada da jurisprudência Roe x Wade, que datava de 1973 e garantiu a liberdade de duas gerações de mulheres de decidir sobre seu corpo, seguida pela aprovação de leis em estados republicanos que em alguns casos impedem o aborto até mesmo em casos de risco para a saúde da mãe, inviabilidade do feto, estupro e incesto, causa indignação em muitas pessoas.
Os esforços de Trump de reverter a derrota eleitoral em 2020, que resultaram na invasão do Capitólio em janeiro do ano seguinte e em um pedido de impeachment e em dois processos criminais, um federal e outro na Geórgia, também desencorajam eleitores moderados.
Desde que Biden assumiu, no início de 2021, os policiais depararam com 10 milhões de imigrantes ilegais. Não se sabe se alguns deles entraram várias vezes. Não se sabe quantos entraram despercebidos. Trump fala na entrada de 21 milhões de imigrantes, muitos deles criminosos, sem apresentar evidências disso.
Ele também trouxe para a campanha histórias de cidades pequenas “invadidas” por venezuelanos, haitianos e nicaraguenses, como Springfield (Ohio), Whitewater (Wisconsin) e Charlerois (Pensilvânia), esses dois últimos, estados-pêndulo.
Alguns eleitores independentes rejeitam a xenofobia e até racismo contidos em frases de Trump como “os imigrantes envenenam o sangue da América” e histórias de que os haitianos estariam comendo animais de estimação, desmentidas pelas autoridades locais republicanas em Ohio. Outros, no entanto, se sentem compelidos a votar em Trump por acreditar que ele seria mais efetivo na contenção da imigração. Isso inclui até mesmo latinos imigrantes ou descendentes deles.
Os Estados Unidos têm hoje uma inflação de apenas 2,4%, e desemprego também baixo, de 4,1%. Entretanto, o recorde de inflação em 2022, que chegou a 9,1% em junho, resultou em um aumento do custo de vida, que persiste até hoje, e abala principalmente a base eleitoral democrata: a classe média e baixa, os latinos e negros.
Com tudo isso, Harris tem mais eleitores do que Trump entre mulheres, latinos e negros, mas numa proporção menor do que Biden em 2020. Esses grupos demográficos foram importantes para garantir a vitória democrata quatro anos atrás.
As questões relacionadas com políticas públicas favorecem Trump. Elas estão muito presentes nos comerciais de TV e na parte lida dos discursos de Trump, preparados por sua equipe de marketing político. Quando desanda a falar de improviso, no entanto, ele desagrada e até assusta os moderados.
Nos últimos dias, ele disse que seria bom se a líder republicana Liz Cheney, que apoia Harris, tivesse fuzis apontados contra ela, e que se dessem um tiro contra ele que passasse pelos jornalistas que cobriam seu comício domingo, ele não se importaria. Se Trump perder essa eleição, a culpa recairá sobre ele mesmo.