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    Caio Junqueira
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    Caio Junqueira

    Formado em Direito e Jornalismo, cobre política há 20 anos, 10 deles em Brasília cobrindo os 3 Poderes. Passou por Folha, Valor, Estadão e Crusoé

    William Waack

    Governo Lula reavalia decisão e atrasa adesão a “Clube dos Ricos”

    Celso Amorim lidera a resistência no governo Lula à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)

    O governo Lula reavalia o memorando, negociado por Jair Bolsonaro, com os termos da adesão do Brasil a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e, na prática, travou o processo de entrada no chamado “Clube dos Ricos”.

    O grupo é formado pelos países mais ricos, como Estados Unidos, Alemanha, Japão, França, Canadá e Itália. As nações assumem acordos para boas práticas em diversas áreas, da economia à democracia, e passam por escrutínios e avaliações constantes da eficiência de políticas públicos e de princípios liberais pelo conjunto de integrantes. Um dos lemas é “better policies, better lives” (melhores políticas, vidas melhores). Na América Latina, já fazem parte da OCDE: Chile, México, Colômbia e Costa Rica.

    O assessor especial para assuntos internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, lidera a resistência no governo Lula à OCDE. O movimento encontra respaldo em outros setores, como a Casa Civil, o PT e parte do Itamaraty.

    Os motivos, apontados nos bastidores, têm principalmente motivações ideológicas e políticas.

    Primeiro, uma premissa de que o “clube” tem um viés neocolonialista, pois é liderado por potências ocidentais que defendem a adesão dos demais países a uma série de regras. Isso em um contexto que esses setores do governo têm uma preferência por uma ordem mundial, na qual o Sul Global e organismos como os Brics sejam priorizados.

    Segundo, há uma visão de que a OCDE vem se tornando um bloco com um viés mais político do que econômico. A organização, por exemplo, condenou a invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro de 2023, o que gerou críticas de diplomatas brasileiros, por não ser uma instância diplomática.

    Um outro exemplo nesta linha foram as posições favoráveis a Lava Jato do Grupo Anticorrupção da OCDE no auge da operação em 2016. Lula seria preso dois anos depois, justamente em decorrência da investigação e o governo, atualmente, lidera, junto com parte do STF, uma revisão dessa narrativa.

    Por fim, há a leitura de que a resistência serve como contraponto aos governos de direita, de Michel Temer e Jair Bolsonaro, que tiveram, como uma das prioridades em política externa, a adesão ao bloco. Bolsonaro inclusive tratou diretamente do assunto com Donald Trump, em 2019, e ganhou o apoio público dele à reivindicação.

    Mas os primeiros contatos do Brasil com a OCDE ocorreram muito antes. Começou com Fernando Henrique Cardoso e teve seguimento nos governos petistas de Lula e Dilma Rousseff. Foi em 2007, por exemplo, durante o Lula 2, que o país virou “key partner”.

    Nos governos Temer e Bolsonaro, o processo se acelerou e, em 2022, virou país-candidato, da qual também fazem parte Argentina, Peru, Indonésia, Tailândia, Croácia, Romênia e Bulgária.

    Itamaraty

    No governo Lula 3, um grupo de trabalho foi criado, em agosto de 2023, para tratar do assunto, mas não se reúne com frequência. A primeira reunião de 2025 ocorreria no fim de janeiro, mas foi adiada. O motivo foi que apenas 40% dos ministérios responderam, até agora, ao Itamaraty sobre as avaliações de impacto das medidas.

    Em conversa com a CNN, o secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Maurício Lyrio, disse que o trabalho em curso visa avaliar as vantagens e desvantagens do acordo, que tem cerca de 260 condicionantes, das quais calcula-se que o Brasil já cumpre pelo menos 120.

    “Há uma série de exigências, de compromissos que o governo brasileiro precisaria assumir, que leva a necessidade de uma avaliação criteriosa sobre impactos e custos em setores específicos”, afirmou.

    Ele cita, por exemplo, algumas áreas que demandam um trabalho extenso de avaliação. “O acordo prevê a abertura do mercado de advocacia para outros países. Houve, inclusive, gestões da OAB deixando clara sua oposição a isso. Há muitas regras que impactam o fluxo de capitais. Isso para ficar em dois exemplos. Os compromissos exigem avaliação de custos e levantar isso é um trabalho complexo”, declarou Lyrio.

    Apesar dos procedimentos terem atrasado o processo, o Brasil continua a ter uma relação próxima com a OCDE.

    Lyrio e o chanceler Mauro Vieira já estiveram, por duas vezes, na sede da organização em Paris, onde há um grupo de diplomatas brasileiros trabalhando. Em dezembro, houve a assinatura de um termo na área de integridade da informação, uma área que o governo Lula, em geral, prioriza.

    Além disso, muitas instituições brasileiras têm contato direto com a organização. Na semana passada, por exemplo, o presidente do Tribunal de Contas da União, Vital do Rêgo, esteve por lá e ouviu reclamações dos dirigentes, que disseram sequer serem recebidos pelo governo brasileiro. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, também fez uma visita ao grupo no ano passado e há uma interlocução direta da OCDE com agências reguladoras brasileiras, como CVM e Cade, além de governos estaduais.

    O governo brasileiro também trabalha para dar transparência ao memorando assinado pelo governo Bolsonaro, um último passo da adesão, como forma de levar o debate à sociedade. A OCDE exige sigilo nos termos, segundo fontes do governo.

    Dentro do próprio governo Lula, há setores favoráveis à adesão, mas como a linha do Palácio do Planalto é de resistência, o assunto é tratado com muita discrição. Os relatos são de apoio da agenda da OCDE por parte, pelo menos, do Ministério da Fazenda; do Planejamento e Orçamento; do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços; e da Controladoria-Geral da União. A CNN procurou todos. A Fazenda disse que o assunto cabe ao Itamaraty. A CGU disse não ter uma posição sobre o assunto. E o Planejamento e Orçamento não se manifestou oficialmente.

    Quem se expôs mais foi o o ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, e vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB). Por meio da assessoria, ele informou que não é contrário à adesão.

    Através de nota, o Ministério do Planejamento e Orçamento afirmou que “desde 2023, o MPO participa do Grupo de Trabalho Interministerial sobre a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (GTI-OCDE), coordenado pelo Ministério das Relações Exteriores (MRE), a quem cabe a condução deste tema”.

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