OPINIÃO
A resposta francesa ao racismo transfóbico argentino
Os Jogos Olímpicos 2024 ainda não acabaram, mas já traz uma marca que pode ecoar nas próximas edições desse tipo de evento no futuro: o enfrentamento ao racismo, seja nas ações do COI (Comitê Olímpico Internacional), coibindo atitudes que pudessem levar a essas práticas, e na atitude das torcidas, que até então só se via em parte ecoando atos racistas, desta vez se manifestando maciçamente contra atitudes racistas.
O foco foi a delegação argentina. Dias atrás, na comemoração da Copa América, a seleção de futebol entoou uma música racista ofendendo negros de origem africana que jogam na seleção francesa. O canto ainda tinha um elemento de transfobia ao citar um suposto relacionamento do jogador Kylian Mbappé com a modelo trans Inês Rau. Se a finalidade de alguns jogadores argentinos era mexer com os torcedores franceses, eles conseguiram uma resposta de todos os franceses nas diversas modalidades nas quais os argentinos competiram.
A manifestação mais marcante foi durante a derrota dos argentinos para a seleção da França, que já no início do jogo teve que ouvir o hino do seu país sendo vaiado pela torcida francesa, que não parou por aí; vaiou o tempo todo em modalidades como rugby, hóquei na grama e até mesmo em partidas de tênis, quando a dupla argentina Máximo Gonzalez e Andres Molteni enfrentou Rafael Nadal e Carlos Alcaraz.
O Brasil, país de maioria afrodescendente, sabe exatamente o que é ser achincalhado de forma racista, sobretudo no futebol, pelos argentinos. Já houve até indiciamento de torcedores argentinos em nosso país por ofensas racistas, atos que parecem estar longe de acabar, principalmente pelo clima social e político que vive o país vizinho. É só lembrar que uma das primeiras medidas de Milei depois de tomar posse foi fechar o Instituto Federal que combatia o racismo, a discriminação e a xenofobia na Argentina. Quando do episódio da cantiga racista da seleção argentina, condenada por todos do mundo esportivo, o presidente declarou: “Ninguém vai dizer o que a seleção campeã do mundo pode fazer”.
O racismo, muito mais que um crime inafiançável em países como Brasil, é um ato que atenta contra a humanidade. É só lembrar que foi usando desse pretexto que mais de 15 milhões de africanos foram comercializados, escravizados, torturados e mortos durante quase 400 anos nas Américas; também foi responsável no século 20 pela morte de milhões de judeus, ciganos e outras minorias na Alemanha nazista. Por isso, todo ato de racismo deve ser condenado veementemente, seja ele vindo de uma seleção de futebol, de um governo ou de parcela da população de um país.
A reação francesa é mais que admirável, principalmente vinda de um país que também tem precedentes em ações colonialistas em muitos países africanos no passado e ainda na atualidade, assim como diante do tratamento que os descendentes dos africanos recebem em território francês. Porém, algo de novo aconteceu nessas Olimpíadas com a manifestação da torcida condenando e vaiando os argentinos pelos cânticos racistas, e isso tem que ser considerado um avanço na luta antirracista internacional.