MP abre inquérito para apurar denúncia da CNN sobre subnotificação em São Paulo
A CNN mostrou e-mails internos mostrando que apenas casos de profissionais da saúde com queixa respiratória seriam comunicados ao Ministério da Saúde
O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) instaurou um inquérito civil, na tarde desta quarta-feira (2), para apurar as denúncias sobre subnotificação de casos do novo coronavírus em São Paulo. Isso aconteceu após a publicação da reportagem da CNN “E-mails mostram ordem para subnotificar COVID-19 em 37 postos de saúde de SP“.
A CNN mostrou e-mails internos da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo e de uma organização social de saúde, chamada Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (CEJAM), que é responsável pela gestão de 37 unidades públicas de saúde. Um e-mail enviado em 25 de março determinava que casos do novo coronavírus da população em geral não seriam notificados ao Ministério da Saúde. Apenas casos de profissionais da saúde com queixa respiratória seriam comunicados oficialmente ao governo federal.
Na portaria do MP-SP, os promotores Arthur Pinto Filho e Dora Strilicherk citam trechos da reportagem e pedem esclarecimentos à Secretaria Estadual de Saúde, à Secretaria Municipal de Saúde e ao CEJAM.
Para a Secretaria Estadual da Saúde, o Ministério Público cita o teor da Resolução SS-28 de 17/03/2020, que determina a subnotificação dos casos suspeitos de coronavírus em todos os serviços de saúde sob gestão estadual, e pede para o órgão “esclarecer sobre a legalidade, eficiência e transparência de referida determinação, bem como das medidas adotadas para adoção imediata de notificação de todos os casos suspeitos de coronavírus, na rede estadual de saúde, aos sistemas oficiais de informação epidemiológica”. Um prazo de cinco dias foi dado para o órgão responder.
Para a Secretaria Municipal da Saúde, o MP-SP pede que o órgão instaure um processo administrativo para apurar os fatos e que “comprove ter expedido determinação a todos os serviços de saúde, da rede direta e também aqueles administrados por OSS [organizações sociais de saúde], nos termos da Nota expedida pela COVISA [Coordenaria de Vigilância em Saúde]”. O mesmo tempo de resposta, de cinco dias, foi dado.
E o Cejam tem um prazo de 48 horas para responder aos promotores como uma organização social de saúde, que administra serviço público municipal de saúde, com repasse de verba do município, “desdenha das determinações do Gestor Municipal de saúde adotando procedimento que favorece à subnotificação dos casos suspeitos de coronavírus”. O Ministério Público pede ainda que a entidade “comprove ter emitido às unidades de saúde sob sua administração determinação de notificação aos órgãos oficiais de todos os casos suspeitos de coronavírus, nos moldes determinados pela Secretaria Municipal de Saúde.”
Outro lado
Em nota à CNN, o CEJAM disse que que “segue estritamente as orientações passadas pelas Secretarias de Saúde” e que “segue normalmente com o atendimento à população em todas as unidades que atua, tendo como foco principal orientar as pessoas que de fato necessitem de um atendimento intensivo, direcionando, quando necessário, para um procedimento mais incisivo visando um tratamento ágil e eficiente.”
O CEJAM, que é responsável pelo gerenciamento de 92 unidades de saúde e hospitais de municípios como São Paulo, Mogi das Cruzes e Campinas, diz que está à disposição do Ministério Público para qualquer esclarecimento. Ressalta ainda que segue normalmente com o atendimento à população.
Questionada sobre a orientação do Cejam, a diretora da Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, Helena Sato, disse não reconhecer a determinação passada aos postos de saúde.
“No Estado de São Paulo e no país, a orientação é a notificação de pessoas de qualquer idade que apresentam tosse, febre e coriza nasal. Com a transmissão sustentada, não monitoramos mais quem saiu do país. Em conversa com o Ministério da Saúde, considerando o aumento o número de casos, há sim uma discussão se iremos começar o acompanhar os casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), ou seja, pessoas de qualquer idade que apresentarem febre, tosse e falta de ar”, disse.
Segundo Sato, o estado de São Paulo não deixará de notificar os casos leves, mas ela ressaltou a necessidade urgente de um olhar voltado para crises graves, principalmente em pessoas do grupos de risco.
A Secretaria Estadual de Saúde disse que foi notificada e prestará todos os esclarecimentos ao Ministério Público, e que está à disposição do órgão. “O Estado de São Paulo cumpre as diretrizes do SUS quanto à notificação de dados, definidas pelo Ministério da Saúde”, afirmou a secretaria.
Em nota, o Ministério da Saúde disse que a orientação é de que todos os casos de coronavírus sejam notificados em até 24 horas a partir do conhecimento de caso. Segundo a pasta, qualquer orientação diferente desta não é do ministério, nem foi comunicada a ele.
A Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo disse que a Coordenadoria de Vigilância em Saúde do Município de São Paulo (Covisa) “não segue este protocolo que a reportagem menciona, emitido pelo Ministério da Saúde e Secretaria de Estado da Saúde conforme a Resolução SS – 28, de 17 de março de 2020.”
Ainda segundo a secretaria, “uma mensagem foi enviada, erroneamente, comunicando o protocolo emitido pelo governo do Estado. A mensagem de retificação foi enviada em seguida restabelecendo o protocolo emitido em 19/3 que permanece vigente” até esta quinta-feira (2).
O órgão municipal afirmou que, “neste caso específico, o município decidiu manter o protocolo anterior, por entender que a situação epidemiológica específica da capital paulista exige que todo caso clinicamente indicado por médico como suspeito deve ser notificado independente de sua gravidade.”