Tirar os alimentos ultraprocessados de dentro das escolas: uma medida necessária
O cenário epidemiológico da população brasileira é alarmante quando se trata de saúde e alimentação. O aumento do excesso de peso e das doenças crônicas relacionadas à má alimentação é evidente em todas as faixas etárias, incluindo a infância e a adolescência. Essa realidade preocupante exige ações efetivas, como o banimento dos alimentos ultraprocessados nas escolas. Não podemos mais dourar a pílula.
Diversos estudos e pesquisas realizados ao longo da última década mostram que o problema é crescente. De acordo com dados do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional do Ministério da Saúde, em 2022, quase 15% (14,25%) das crianças brasileiras menores de 5 anos estavam com excesso de peso, e entre as crianças de 5 a 9 anos, esse número chegou a mais de 30% (32,24%). Também o Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA) e a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) revelaram altas taxas de sobrepeso e obesidade em adolescentes.
A infância é uma fase crucial para a construção de hábitos saudáveis, incluindo uma alimentação balanceada e a prática regular de atividade física. As preferências alimentares são estabelecidas nessa fase e tendem a persistir na idade adulta. Portanto, ao lado dos pais, familiares, responsáveis e professores, as escolas desempenham um papel fundamental na formação desses hábitos e têm o potencial de influenciar positivamente as escolhas alimentares para toda uma vida.
O Brasil já possui um direcionamento importante em relação a esse tema, que é o O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que atende as escolas públicas e que alinhado ao Guia Alimentar para a População Brasileira, busca superar barreiras e incentivar a adoção de hábitos saudáveis por meio da oferta de uma alimentação saudável e da educação alimentar e nutricional. Embora seja mais conhecido por seu impacto nas escolas públicas, o PNAE também se aplica a escolas filantrópicas e comunitárias, além de escolas conveniadas com o poder público. No entanto, é importante ressaltar que, embora a alimentação escolar oferecida pelo PNAE siga as diretrizes adequadas, os alimentos comercializados nas cantinas muitas vezes não seguem essas recomendações.
Pesquisas mostram que as cantinas escolares, tanto em escolas públicas quanto privadas, oferecem predominantemente alimentos ultraprocessados, de baixo valor nutricional. A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) revelou que 31,4% dos estudantes frequentam escolas públicas com cantinas que vendem alimentos não saudáveis, os ultraprocessados, enquanto esse percentual aumenta para 88% nas escolas privadas.
Além dos prejuízos à saúde, a presença de alimentos ultraprocessados nas escolas também afeta o desempenho acadêmico e o comportamento das crianças. Um estudo conduzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), publicado em 2020, mostrou que a oferta de uma alimentação saudável nas escolas está diretamente relacionada a melhorias no desempenho escolar e na capacidade de concentração dos alunos.
Além do banimento dos alimentos ultraprocessados, é essencial promover a educação alimentar e nutricional em todas as escolas, envolvendo cuidadores, responsáveis, merendeiras, cantineiros, professores e diretores. Também é importante enxergar as cantinas como espaços de trabalho e geradores de renda, incentivando a implementação de cantinas saudáveis, que ofereçam opções nutritivas e viáveis economicamente.
O Governo Federal tem avançado nessa questão, mas ainda há muito a ser feito. Um acordo de Cooperação Técnica entre os ministérios do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Saúde (MS), Educação (MEC) e Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) vai garantir que 30% da alimentação na rede de ensino seja proveniente da agricultura familiar. Paralelamente, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) teve aumento do financiamento federal no início do ano e chegará ao montante de R$5,5 bilhões neste ano.
Essas medidas estão alinhadas às recomendações internacionais como a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Banco Mundial e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Além disso, estudos realizados nos Estados Unidos mostraram que o estabelecimento de padrões nutricionais para alimentos vendidos nas escolas pode prevenir milhares de casos de obesidade infantil.
Não agir diante desse problema é arriscar a saúde e o futuro das crianças e adolescentes. Com o aumento preocupante do diabetes tipo 2 e da hipertensão associados à má alimentação, é imperativo que medidas efetivas sejam implementadas para garantir um ambiente escolar saudável e promover hábitos alimentares adequados desde a infância. A saúde e o bem-estar das crianças e adolescentes dependem disso.
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