Fim da violência contra a mulher pressupõe oportunidades iguais
A campanha “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher”, que no Brasil tem início neste 20 de novembro, é uma convocação ao esforço de mulheres e homens por uma sociedade justa e igualitária, sem discriminações de qualquer espécie.
A campanha convoca para uma mobilização contra a violência de gênero, terreno no qual nossas estatísticas são vergonhosamente pródigas. No primeiro semestre deste ano, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos recebeu denúncias sobre 169.676 violações de direitos de mulheres no ambiente doméstico ou familiar. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o país registrou, em 2021, 1.319 casos de feminicídio e 56.098 estupros contra vítimas do gênero feminino, incluindo vulneráveis.
Em sentido mais amplo, a campanha é uma convocação para a luta pela equidade. É importante entender que o país que almejamos, onde as mulheres não sejam assassinadas e violentadas cotidianamente, haverá de ser, também, um lugar no qual elas possam desfrutar da autonomia econômica e da realização profissional que lhes têm sido negadas ao longo dos séculos de estruturação da nossa sociedade patriarcal.
Em agosto, quando tomei posse na presidência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as notícias destacaram o fato de eu ser a segunda mulher a assumir tão importante cargo (a primeira havia sido a ministra Laurita Vaz, no biênio 2016-2018). Se tal circunstância pode ser vista como um progresso da representação feminina no Poder Judiciário – como o é a presença atual da ministra Rosa Weber na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) –, não há como ignorar o quão lentamente caminha esse processo: o STJ tem apenas 6 de suas 33 cadeiras ocupadas por mulheres; no STF, são 2 em um total de 11.
Um levantamento produzido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) mostra que, em toda a sua história de 131 anos, o STF teve 167 ministros e apenas 3 ministras – a primeira delas, Ellen Gracie, empossada em 2000, mais de um século após a fundação da corte. No STJ, instalado em 1989, tivemos, até hoje, 88 ministros e 8 ministras.
Segundo a mesma fonte, a participação de mulheres na composição do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde a sua fundação, em 2004, até 31 de julho de 2022, foi de apenas 20%. Atualmente, são 12 conselheiros e 3 conselheiras.
Num país em que as mulheres são mais da metade da população, elas eram apenas 38,8% da magistratura em 2019, conforme diagnóstico do CNJ, e, ainda assim, muito concentradas nos cargos de juíza substituta (45,7%) e juíza titular (39,3%), enquanto as desembargadoras e ministras, dependentes de um processo de seleção político e fortemente controlado por homens, não passavam de 25,7% e 19,6%, respectivamente.
A distribuição equitativa de oportunidades de participação na vida econômica e política é um pressuposto dos demais aspectos da igualdade de gênero, como bem expressa o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 da Agenda 2030 das Nações Unidas, que trata do empoderamento de mulheres e meninas – agenda incorporada às ações institucionais do Tribunal da Cidadania.
Fiz referência, no início, ao engajamento de mulheres e homens, pois também é deles a responsabilidade de modificar a situação que, infelizmente, ainda dá sentido a uma campanha como essa – e não por concessão ou mera solidariedade, mas porque reconhecer e combater o machismo estrutural é condição para nosso pleno desenvolvimento econômico, social e político. Só com o empenho de todos – mulheres e homens, lado a lado – é que poderemos avançar nessa direção.
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