Análise: o risco de normalização da inflação mais alta
O IPCA está rodando próximo de 5% desde final de 2024 e pode ficar bem acima disso em dezembro deste ano, muito distante da meta contínua de 3%


Da Arábia Saudita, onde participa de um encontro com lideranças regionais e de evento do FMI, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que a inflação no Brasil entre 4% e 5% está “relativamente dentro da normalidade para o Plano Real”.
O IPCA está rodando próximo de 5% desde final de 2024 e pode ficar bem acima disso em dezembro deste ano, muito distante da meta contínua de 3% – estabelecida e aprovada pelo governo Lula 3.
No relatório Focus desta segunda-feria (17), a previsão para o índice oficial subiu pela décima oitava semana seguida para 5,60%.
As estimativas para 2026, 2027 e 2028 também tiveram reajustes para cima, tirando o cumprimento da meta fora do horizonte da política monetária da gestão de Lula 3, (respectivamente 4,35% 4% e 3,80% são as novas previsões para o IPCA).
A fala do ministro Haddad no Oriente Médio comete um pecado recorrente dos governos do PT, que acredita que uma “inflação mais alta um pouco não é um problema”. Os petistas não consideram o Brasil capaz de ter uma inflação menor, no patamar de países emergentes como o nosso, na casa do 3% ou até menos.
Até porque, a última milha para que o índice de preços caia estruturalmente para esse nível mais baixo depende de uma reforma inquestionável da política fiscal, ou seja, aquela que gere equilíbrio nas contas públicas e no endividamento federal. Tudo indica, fora de questão atualmente.
E aqui, mais uma vez, a comparação com a gestão de Dilma Rousseff fica inevitável.
Durante seu primeiro mandato, a meta de inflação era 4,5%, nunca alcançada, com resultado dos quatro anos ficando entre 5,8% e 6,5%. Mas para a ex-presidente, a meta estava sendo cumprida, já que o limite de tolerância era de 2 pontos percentuais.
E o BC, não reagia? Sim, reduzindo os juros! Não foi à toa, ou sem querer, que a autoridade monetária sob Dilma perdeu completamente a credibilidade.
Hoje, o BC é independente e está sozinho na batalha pela reancoragem das expectativas, promovendo um duro choque de juros na economia. A continuidade da piora nas previsões para o IPCA, como revelado nesta segunda-feira pelo Focus, dificulta ainda mais o trabalho do Copom.
Mesmo diante de uma desaceleração da atividade econômica, tudo indica, já em curso, a queda dos preços está condicionada a uma série de eventos fora do alcance da taxa de juros. A incerteza sobre os impactos da política de Donald Trump nos Estados Unidos entre eles.
Sobre a fala de Haddad na Arábia Saudita, uma última observação não menos significativa, é o fato do ministro usar o Plano Real como referência para acomodar o comportamento atual da inflação.
Ora, o Plano Real aconteceu há mais de 30 anos! Se a economia mudou tanto depois de tantas reformas – Haddad inclusive comemora algumas delas – por que deveríamos aceitar a “média” de três décadas como referência, ou pior, como justificativa para continuarmos com uma inflação mais alta?
A normalização desse quadro preocupa e faz parte do prêmio de risco embutido nos ativos brasileiros. O real se valorizou desde o início do ano, saindo da casa dos R$ 6,00, mas estamos longe de sair da zona de risco, ao contrário.
Fernando Haddad gere a economia sem ter aprovado o orçamento do ano, tem uma série de tarefas nada triviais para corrigir as contas, com o governo vivendo seu pior momento de popularidade. Aliás, o pior momento não é apenas o desse mandato de Lula, é sobre sua história como presidente do Brasil.