Guerras, super-ricos e a sombra de Trump: o que emperra o acordo no G20 no Brasil
Pontos de divergência cresceram e maior temor é que as diferenças se tornarem intransponíveis a ponto de impedir um comunicado final
A menos de 48 horas do início da reunião de cúpula do G20, o clima é de cautela e tensão entre os diplomatas brasileiros. Os pontos de divergência cresceram e o maior temor é que as diferenças se tornarem intransponíveis a ponto de impedir um comunicado final.
A hipótese de um fracasso existe, mas é remota, dizem diplomatas que participam das reuniões preparatórias.
A principal divergência no grupo está na geopolítica. Países do grupo têm visões opostas sobre como o G20 deve tratar a guerra na Ucrânia e na Faixa de Gaza. Há países que defendem os ucranianos e normalmente também apoiam o direito de Israel de atacar o Hamas.
Mas a outra parte do G20 entende que Rússia e Ucrânia devem ser tratados igualmente em tom crítico. Também defendem o mesmo tratamento a Israel e ao Hamas.
Sem um consenso no tema, é provável que o comunicado final traga menções genéricas aos conflitos – talvez sem mencioná-los nominalmente – e com uso de palavras de pouca força.
O segundo ponto de divergência é novo e surgiu com a Argentina. Em julho, ministros de finanças do grupo chegaram a um acordo para tratar o tema super-ricos. Na ocasião, os ministros – inclusive o argentino Luis Caputo – concordaram com a criação de um marco internacional mínimo para encaminhar o tema.
“Com pleno respeito à soberania tributária, buscaremos cooperar para garantir que os indivíduos ultra ricos sejam efetivamente tributados”, citava o texto assinado em julho. Agora, a Argentina mudou de posição e quer retirar as menções do texto final sem apresentar uma alternativa ao grupo.
O G20 funciona com consensos. Isso quer dizer que o comunicado final trará apenas os temas em que há concordância de todos os países do grupo.
Assim, se a Argentina não concordar com o texto proposto, poderá inviabilizar tratar o assunto super-ricos no comunicado final – o que seria uma grande derrota diplomática para o Brasil.
Para além dos dois temas concretos, as reuniões preparatórias foram palco de uma mudança de discurso da Argentina em outros temas: desenvolvimento sustentável, reforma de organismos multilaterais e combate à mudança climática.
Essa mudança de discurso tem sido encarada por alguns diplomatas como “uma sombra de Trump” no G20. Ainda que o presidente eleito dos Estados Unidos não esteja no cargo, alguns citam que ele teria influenciado a diplomacia de Javier Milei a adotar um tom mais radical contra bandeiras consideradas “progressistas”.
Apesar de estar emperradas em alguns tópicos importantes, diplomatas avaliam como remota a hipótese de um fracasso da reunião, sem um comunicado final.
“Se esse risco existir por iniciativa da Argentina, o país será muito pressionado pelos outros delegados”, disse um diplomata estrangeiro que participa da reunião.